S18E11 Alemanha 3

HAM5

SÃO PAULO | À análise de todos os fatos que se concentram naquela entrada de boxes mal sucedida de Hamilton, a pedido da equipe, que lhe deu a vitória na Alemanha com cândido respaldo da FIA.

Se ainda não existe no mundo um workshop de ‘Como trabalhar a estratégia e a ação de uma equipe durante uma mudança de rumo em uma corrida de F1’, aquele que o criar e o oferecer a Toto Wolff com aulas bem específicas pode ficar rico. Porque a entrada do safety-car pegou novamente a Mercedes de surpresa – e olha que era esperadíssimo dada a condição da pista e o acidente de Vettel. Bottas apareceu nos pits, e o time nem pronto estava para trocar os pneus. Também hesitou em qual escolhê-los. O pessoal levou, então, o grupo de roxos não muito rapidamente.

Nisso, Hamilton foi chamado. Mas como rolava aquele rebu, e todas as atenções da Mercedes se desviaram para tal, a única coisa que o engenheiro responsável fez foi avisar em tom de desespero para que demovesse da ideia. Só que Lewis já estava no caminho para os pits. Foi hábil em jogar o carro à esquerda, evitar a parada em que perderia tempo atrás do companheiro e permanecer na pista.

Ainda na adrenalina, a Mercedes não sabia bem como agir, tanto que, mesmo depois de longos minutos em período de SC e da relargada, Bottas foi lá atacar Hamilton como se não houvesse amanhã. Não houve, pois, nenhuma determinação de quem quer que fosse para que o finlandês ficasse cozinhando o chucrute. Com a casa à base de camomila, notaram que, puxa vida, o primeiro piloto não poderia se dar ao luxo de perder aquela prova.

Mas para não perdê-la, houve quem deve ter pensado – ou eventualmente avisado – que aquela manobra de Hamilton feria o Código Esportivo Internacional – ou seja, válido para todas as categorias sob governança da FIA. No apêndice L, item D, resumidamente, diz-se que “exceto em casos de força maior (…), cruzar a linha dos pits e da pista é proibido”. O código, bem como o regulamento, não é um dicionário, de modo que não é preciso descrever o que é força maior. Mas, se necessário, para a situação específica, seria algo que atrapalhe fisicamente a passagem do piloto pelos boxes: um acidente entre dois ou mais carros, um aerolito ou um meteoro, etc.

No código não consta exceção, tampouco aplicação de bom senso, seja o significado que for. Até porque, fosse assim, seria algo plenamente interpretativo com auxílio de um VAR, digamos.

Diante disso, a Mercedes pôs-se a analisar o que poderia lhe acontecer: uma punição. A mais recente para estes casos aconteceu com Kimi Räikkönen no GP da Europa, assim denominado então, em Baku há dois anos. O finlandês acabou considerado culpado pela infração e levou 5 segundos na lomba. Normal, pois, que Hamilton também fosse agraciado com semelhante pena. Assim, a Mercedes teria de fazer com que Hamilton andasse o mais rápido que pudesse enquanto Bottas segurava Räikkönen para abrir estes 5 segundos.

Mas ficaria um ponto em questão: se abrisse mais de 5 segundos, fosse considerado culpado e punido como foi Räikkönen, capaz de entenderem pelos lados da FIA que se tratava de uma passada de pano. Até porque um argumento bom pró-punição seria o de que não haveria como calcular o tempo que Hamilton teria perdido nos boxes se tivesse ficado parado atrás do companheiro, de modo que o corte de caminho lhe beneficiou diretamente. Räikkönen poderia muito bem ter voltado na frente dele. Talvez tal pena não fosse suficiente, e os comissários aplicariam mais tempo, digamos 10 segundos.

Mera elucubração aqui, diante desse cenário: a Mercedes pode ter trabalhado em algum momento para garantir a dobradinha e ter ficado nesta faixa de 5 segundos – a distância final foi de 4s5. Com esta punição, Hamilton perderia a vitória para Bottas, mas os troféus de 1-2 seriam mantidos. Tivesse sido de 10s, Bottas venceria e Hamilton cairia para terceiro.

Então a comemoração aconteceu sob intensa chuva e, com relativo tempo depois, a FIA anunciou sua investigação sobre o caso, chamando Hamilton e a Mercedes para uma conversa.

A conversa demorou mais de uma hora, o que significa que houve muita argumentação e contra argumentação. Só que numa lida básica e literal do regulamento, não há muito o que fugir: o desvio de Hamilton se deu por ordem e estratégia da Mercedes, o que está longe anos-luz de ser algo que se encaixe um caso de força maior.

A decisão também demorou a ser publicada, e entende-se pelo tamanho da explicação no comunicado da FIA. Hamilton manteve a vitória e saiu apenas com um puxão de orelha. Segue a tradução dos três fatos levados em conta:

  1. O piloto e a equipe candidamente admitiram o erro e o fato de que havia uma confusão dentro do time sobre se permaneceriam na pista ou entrariam nos boxes, e isso os levou à infração;
  2. O fato de que a infração aconteceu sob o safety-car;
  3. E que no momento não houve nenhum perigo a outro competidor e que a mudança de direção foi executada de maneira segura;

A leitura do início do primeiro argumento é de parar e recomeçar em loop até chegar na palavra ‘candidamente’. Que diabos um predicado deste é considerado para definir um ponto contra uma punição? Então a CANDURA com que Hamilton e a Mercedes argumentaram e confessaram o erro flechou o coraçãozinho de seus comissários, fofos, e eles, com carinho e ternura, pegaram o piloto, puseram-no para ninar, deram o champanhe como se fosse o tetê e ameaçaram colocar no cantinho do castigo da próxima vez? Que porra é essa, gente? Isso é sério?

Segue: e daí que a infração aconteceu sob o safety-car? O código se refere à entrada nos pits, onde, inclusive, o safety-car não atua quando entra na pista. Não há qualquer referência a exceções, novamente, então isso não poderia ser levado em conta porque o SC não é também motivo de força maior. Por fim: o fato de não haver perigo a outro competidor ou isso ter sido feito de maneira segura é o mínimo que se espera de um piloto diante de uma situação desta – e tem um regulamento específico para infração caso não o faça.

Assim, é muito mais que uma surpresa ver essa decisão da FIA e de seus comissários, ainda mais considerando que estes mesmos prometeram ser mais punitivos diante do incidente provocado por Vettel na largada do GP da França. OK que tirar a vitória de um piloto depois de conquistada e comemorada é feio, mas muito mais feio é rasgar o regulamento por completo, colocando o bom senso travestido de CANDURA para deixar passar.

O precedente está aberto para qualquer um. A impressão de que a decisão foi totalmente política está carimbada. E o caso enlameia a F1 e a deixa descrente perante seu público. E não adianta pedir depois com candura para que acompanhem as corridas e a disputa pelo título que o povo não vai acreditar na seriedade do campeonato.

Comentários

  • Victor, legais suas aparições na ESPN, você está bem localizado, numa dessas reviravoltas a ESPN assume os direitos da Fórmula 1 e você será o comentarista, o novo Cláudio Carsughi.

    Sugestões para o novo nome da Force India:

    – Force Canadian
    – Strong Sun
    – Forza Ragazzo
    – Bora Meu Filho
    – FCT This Team Is Mine
    – Canadian Forcing The Limit
    – Canadian Dollars Playground F1 Team

  • A punição ao não respeitar a linha dos boxes se refere à saída e não à entrada dos boxes.Ao entrar praticamente todos pilotos,conforme a pista não respeitam a linha de entrada.

  • Não seria o caso da FIA começar a aplicar a regra sem margem de interpretação, apenas impondo punições preto no branco para evitar tais questionamentos de que uma equipe alemã, correndo na Alemanha enquanto seu piloto de ouro vence de forma magistral. Ultrapassando todo mundo por ter um carro no mínimo meio segundo mais rápido que a concorrência, se valendo do maior adversário sofrendo um revés de própria culpa e com a mesma equipe germânica se valendo do contestado recurso já tão usado pelos coirmãos italianos, transformando o piloto finlandês, anteriormente visto como um talento, em um mero funcionário do mês.

    Pífio

  • A pior decisão foi a Mercedes não ter deixado o Bottas atacar Hamilton, ia ser uma briga daquelas, o Vettel já estava fora mesmo, estão cortando asas dos pilotos que podem, nem que seja por um momento, ameaçar os candidatos ao titulo…afinal, Fórmula 1 esta deixando de ser sinônimo de risco= sem graça!!!

  • Não que vá fazer diferença no teor da discussão. Mas, eu tive a leitura de que a decisão de voltar pra pista foi do Hamilton. No rádio ele diz: “Kimi stayed out..” e logo em seguida o engenheiro chegou a ficar ‘gago’ dizendo ao Hamilton que ele deveria realmente fazer a parada, e o Hamilton novamente se justificou… Me ajudem caros companheiros, caso a minha percepção tenha sido equivocada. Mas, estou citando isso pelo seguinte: Se realmente foi uma decisão do piloto, ficaria ainda mais desonesta a decisão da FIA, pois seria uma justificativa ridícula sobre um fato que sequer existiu…

    • VM responde: A equipe pede pra ele vir e ele toma o caminho de fora. A decisão é dele. A equipe, depois, passa a pedir pra que ele faça voltas mais rápidas. Ele pergunta: ‘Eu vou ser punido?’. A equipe diz que pode ter uma margem de interpretação, mas pra focar nas voltas rápidas. Foi uma infração clara. Que a FIA achou que o bom senso resolveria…

  • Cara tu tá muito de saco cheio de tudo. O que importa não é o candidamente. É a segurança. Ele não pois em risco a segurança de ninguém. Não vinha ninguém atras que fosse prejudicado. O Kimmi foi punido por um acordo no Briefing dos pilotos antes da corrida. Que não podia cruzar a tao faixa branca da entrada. O Massa a mesma coisa no Brasil. Nesse caso não tinha nada. Simples assim.

  • Na parte de o Hamilton entrar nos boxes e ficar parado atrás do Bottas, isso não aconteceria, na opinião. Ele provavelmente passaria direto pelo pitlane e na volta seguinte, Kimi pararia nos boxes e HAM ficaria a frente na mesma forma. Agora gostaria de saber do Victor, se fosse o Vettel no lugar, ele teria essa mesma opinião sobre a punição.

  • Nem isso consegue me tirar a satisfação que eu tenho em assistir uma corrida de Fórmula 1. Nem a morte do Senna, nem a aposentadoria do Piquet, nem a “candura” de Barrichello e Massa me fizeram ficar menos fã. Ainda mais que, no presente momento, não tendo nativos na categoria nesse ano, escolhi o Leclerc pra torcer (apesar de ter descoberto que, aparentemente, chuva não é o forte dele, a conferir).
    Mas, que é escroto esse jogo de “dois pesos, duas medidas”, é mesmo. E qualquer outro adjetivo pejorativo que seja permitido dentro de uma linguagem eticamente aceitável.
    Dese jeito, só vão ficar assistindo os bajuladores, os interesseiros e os apaixonados, mesmo.
    E hoje foi sacramentada outra situação: A partir do momento em que você se torna segundo piloto, por estar atrás no campeonato ou na corrida, você só pode ganhar se seu companheiro bater ou quebrar. Depois querem falar mal dos caras. Bottas poderia até não ter conseguido passar Hamilton, mas mostrou uma combatividade naquele momento que não é o seu padrão. Claro que, pra ele, esse lugar é o melhor possível, no fundo, ele deve ainda alimentar uma secreta esperança de, numa reviravolta, Hamilton resolver respirar outros ares e ele virar o primeirão pra finalmente ser campeão. Ou achar um ano iluminado e dar uma de Rosberg.
    Raikkonen já é o estilo “dane-se, já tô quase indo embora, vou cuidar da minha filha, plantar musgo (orquídeas não devem nascer naquela friaca toda), fazer queijo de rena e detonar monossilabando todo mundo no Twitter…”
    A temporada acabou. Vai ser uma briga Hamilton x Vettel. Já sabemos qual é a preferência da FIA. Temos a F-1 F (de Finlândia), entre Bottas e Raikkonen. A F-1 C, com Ricciardo e Verstappen. E a F-1 D, que é o resto. Com ligeira vantagem pra Renault e Haas.
    E o troféu Minardi desse ano tá indo pra Williams. Eles não andam de asa aberta pra não rodar. Começa a chover, um para e o outro para também. Não pode molhar o carro pra não dar choque nos pilotos?

  • Outra questão que está me causando espécie e que poderia ser abordada pelo pessoal do GP que acompanha in Loco numa entrevista com Charlie Whiting. O sumiço do VSC nos GPs da Inglaterra e Alemanha. Justo nas corridas que Hamilton estava encrencado. Eu não gosto do VSC . Menos ainda da subjetividade que não deixa transparência em tomada de decisão.

  • A impressão que se tem deste fim de semana é que o Hamilton parece ser parceiro da FIA, pois ele pede (segundo um jornal) que tirem o Rosberg da entrevista, a FIA acata, ele comete uma infração, e a FIA deixa pra lá. Só falta no final do campeonato (caso o Vettel ganhe) ele pedir o título, e a FIA dê a ele.

  • Não sei se a regra mudou, mas uma época se entendia que contava como pit lane apenas da linha de chegada interna em diante. Lembro que na época das “flying laps” pré pitstop com reabastecimento era comum não respeitarem as linhas de entrada para fazer traçados mais agressivos, e lembro que alguém foi punido, certa vez, por desrespeitar a linha na saída, não na entrada do pit lane. Fiquei com a mesma dúvida quando Massa foi punido em Interlagos. Segue aquela regra de tentar manter o campeonato sempre embolado até o fim. Ali mesmo na Alemanha, teve aquele SC que não entrou para que o Rosberg filho vencesse.

  • Concordo em parte! Qdo falaram pro Hamilton pra nao ir ao box, ele nao sabia se tinha ou nao algum motivo de força maior, entao, ele tinha que se preservar ao passo de quea equipe nao sabia que ele estaria exatamente ali naquele segundo, erro justificado mas nao significa que nao tinha que ser punido, talvez só com dinheiro pra nao prejudicar o piloto, só a equipe.

      • Acho que eu nao me fiz entender por que pelo seu tom parece que vc está discordando e foi exatamente o que eu disse. Qdo a equipe fala “no, no, no” pro Hamilton, nao tem como ele saber o que tá acontecendo, por isso, ele nao deveria ser punido, simples assim. Tá dando a impressão que vc tá respondendo meio nervoso a todos, como sua interpretação fosse absoluta. Sinto te dizer que não o rei da verdade! Rsrs

  • Em todos os esportes funciona assim, punições dependem se a equipe é grande ou não, se o atleta em questão é astro/ídolo ou não, se vai influenciar no resultado da prova ou campeonato… Etc enfim a politicagem se sobrepõe as regras. É triste, é nojento, vergonhoso… Mas é assim em praticamente todos os esportes e em outras atividades, infelizmente!

  • Se ele não tivesse largado lá atrás, acredito que teria sido punido. A F1 não iria estragar a estóriazinha do “piloto que largou lá atrás e venceu” por uma “regrazinha”.

  • E outra, acabei de lembrar que no GP Brasil de 2013 o massa cruzou levemente a linha do box e foi punido sem dó. Isso realmente só me entristece mais

    • Tem os times de primeira linha e o resto. O Hamilton e o Vetel, como Ferrari e Mercedes estão imunes as regras! A F1 acabou faz tempo…..

  • Victor. Notei que quando Vettel saiu da pista (imagem do cockpit) e antes de bater , ele vira o volante todo para a esquerda e as rodas permanecem retas. Normalmente ISSO não poderia acontecer , concorda?

    • Entendi o que quis dizer Luiz Dahlem, não reparei na hora, depois vou conferir… se o cara virar o volante as rodas tem que virar, o fato do piso estar seco ou molhado não interfere nisso… ele teria que bater com as rodas esterçadas que teriam deslizado sem aderência.

  • Realmente uma pena. O Hamilton é um grande piloto, não precisa disso no seu curriculum. Ficando mantida essa decisão a mancha estará lá para sempre. Tal como os favorecimentos da Ferrari ao Schumacher. Diminui muito o brilhantismo de tudo o que foi feito até aqui. Seria muito mais correto o respeito ao regulamento afinal não haveria prejuízo ao campeonato de pilotos a punição coma punição com perda de 5 segundos. Lembrem que nunca mais houve tranquilidade com relação às ordens de equipe nas dobradinhas de resultados. Agora perde mais uma vez a F1 a oportunidade de se mostrar diferente: Não é! É só mais um negócio…

  • Concordo com tudo, e outra na Áustria o Vettel foi punido de forma duvidosa sendo q o próprio sainz (a vítima) falou q n era pra punição. Mas isso não apaga a cagada do Vettel…

  • Na medida do possível e pela minha baixa expectativa no inicio do ano, o campeonato vinha sendo interessante. Hoje, depois das ordens de Ferrari e Mercedes aos dois finlandeses e essa não punição ao Hamilton, broxei.

    Claro que continuarei acompanhando, já que quando a gente é apaixonado por um esporte, a gente vira um pouco masoquista, mas que belo balde de água gelada foi esse GP da Alemanha. Seja lá quem ganhe esse ano, taí um campeonato para a famigerada Liberty Media entender que o buraco é muito mais embaixo quando analisar os motivos de perda de público na F1.