Double deckers, 3

SÃO PAULO | Um corridão e tanto, esse da Inglaterra, que põe a F1 numa reflexão de onde ela quer chegar e, acima de tudo, dá o ultimato para que os governantes do automobilismo voltem a mergulhar em estudos profundos para aumentar drasticamente a segurança nas corridas. A bela vitória de Rosberg, um sobrevivente face as explosões dos pneus, acabou ofuscada. Não houve ser no paddock em Silverstone que não estivesse preocupado, e dada a proximidade da corrida da Alemanha, a FIA se viu mais do que obrigada a convocar às pressas uma reunião para verificar o que ocorreu e como não ocorrer mais.

Hamilton, Massa, Vergne e Pérez tiveram contratempos ferozes com seus pneus traseiros esquerdos numa pista de sentido horário e curvas de alta velocidade. Se a Pirelli se desdobra para tentar encontrar uma resposta, e diz que ainda não a tem por ser “algo novo”, é fato que a fornecedora não tem de carregar a culpa solitariamente. De novo: desde sua entrada na F1, a solicitação dada aos italianos é a de que fizessem produtos que chacoalhassem com as corridas a ponto de deixá-las com incógnitas – para que as equipes quebrassem a cabeça e se debruçassem nas várias táticas. Quando o cenário ficou amplamente conhecido no ano passado, tornaram a pedir uma alteração nos compostos; feita, sentiram que o negócio havia passado do ponto. A Pirelli ouviu e acenou com a possibilidade de mudança desde que houvesse uma unanimidade. Lotus e Force India, que sabem tratar os pneus como ninguém, vetaram. A fabricante só alterou a construção, usando kevlar no revestimento, para que não houvesse a tal delaminação e, como sempre faz, deu suas instruções de cambagem e pressão.

É bem verdade que as equipes não seguem as instruções da Pirelli. Pelos quatro nomes ali citados, nota-se que cada um vem de uma esquadra diferente; as que tratam bem os pneus não tiveram contratempos. Houve um momento da corrida em que a Red Bull comunicou a Vettel que estava aumentando a pressão dos pneus para que não houvesse problema, para um número provavelmente apontado pelos italianos.

O regulamento da F1 aponta que não é necessária unanimidade para quaisquer mudanças quando o assunto se trata de segurança. De fato, o campeonato chegou ao limite do tolerável, e só as cenas dos carros destruídos em seus locais de explosões demonstra que se está na iminência de algo pior. Pode ser extremista para quem vê de fora, mas os pilotos que estão ali passam a correr sem nenhuma confiança de que vão terminar bem a corrida – ou, como Massa diz, jogam nas mãos de Deus. E considerando que o esporte vem de mortes recentíssimas – o italiano Andrea Mamé ontem no Lamborghini Super Trofeo e Allan Simonsen nas 24 Horas de Le Mans, por exemplo –, Jean Todt e seu grupo de trabalho têm de voltar imediatamente à mesa para discutir as necessárias modificações e adaptações para evitar que as corridas voltem a se tornar uma carnificina.

A primeira ação a ser tomada é o cancelamento dos testes dos novatos ou sua transformação em treinos para os pneus, abertos, escancarados, sem a necessidade de fazê-los como a Mercedes em Barcelona. Não tem a menor condição de que os pilotos jovens, que já não têm contato com os carros de F1, sejam submetidos a uma avaliação em Silverstone com o risco de enfrentarem a mesma situação – e, sem experiência, correrem o risco de perder o controle do veículo. A outra é que os pilotos tenham suas vozes ouvidas: Webber chegou a dizer que ninguém dá atenção ao que é falado por aqueles que fazem parte do espetáculo, “e, ao que parece, o show tem de continuar”.

O show continua na semana que vem com a ameaça de boicote de várias gentes, Massa incluso. Se a cena seria impossível de ser vista tempos atrás por conta dos vários contratos comerciais que a F1 tem, parece que o mundo tomou gosto por protestar e entender que, reivindicando, é possível ter o que se quer e que os acordos devem ser mandados às favas. Os pilotos têm de tomar uma posição claríssima para pressionar dirigentes (das próprias equipes) e do esporte. O resultado há de vir mais rápido que uma volta voadora.

Comentários

  • O monobloco (habitáculo) se tornou uma célula de sobrevivência para o piloto.
    Mas,
    A Pirelli tem cometido uma falha grotesca na F1.
    A FIA deve agir com rigor para apurar estes fatos.
    A segurança dos pilotos é fundamental.
    Queremos ver uma corrida com total segurança.

  • Victor, pelo que eu li no Grande Prêmio, as equipes Force India e Lotus rejeitaram a modificação que seria feita usando o kevlar e a Pirelli “passou a focar no processo de ligação apenas da versão em aço”.

  • Só lembrando que o piloto “australiano Ashley Cooper” morreu em 2008, e Allan Simonsen é da mesma terra de sua amada seleção.