Blog do Victor Martins
F1

S18E16 RUS1

SÃO PAULO | Foi bom esperar umas várias horas para acompanhar a repercussão de quem protagonizou um novo capítulo do GP da Áustria de 2002. Exagero? Nada. O próprio comandante do ato admitiu isso. Toto Wolff disse que mal dormiu direito pensando em como o episódio do GP da Rússia remeteu ao de 16 anos […]

Wolff

SÃO PAULO | Foi bom esperar umas várias horas para acompanhar a repercussão de quem protagonizou um novo capítulo do GP da Áustria de 2002. Exagero? Nada. O próprio comandante do ato admitiu isso. Toto Wolff disse que mal dormiu direito pensando em como o episódio do GP da Rússia remeteu ao de 16 anos atrás.

Sem querer se gabar por qualquer dom pitonisa, o resultado da classificação de sábado já previa perfeitamente o que aconteceria na corrida. Bottas estava na pole por acaso: era Hamilton quem deveria largar ali não fosse o erro cometido na volta final. Com uma Ferrari aparentemente incapaz de acompanhar o ritmo da Mercedes, era notório que a corrida seria a seguinte: o inglês passaria o finlandês em algum momento, Vettel ocuparia o terceiro lugar no pódio, Räikkönen faria uma corrida solitária para ser quarto e as duas Red Bull, punidas e com um carro bem acertado, logo se livrariam do resto da Série B para serem quinto e sexto com Verstappen – muito melhor – e Ricciardo.

Jogos de equipe foram devidamente camuflados desde que Barrichello deixou Schumacher passar naquele horror de Zeltweg. Oito anos depois – e oito anos antes d’hoje –, veio o ‘Fernando is faster than you’. Episódios como este jamais serão apagados pelo tempo porque quem sente e vive sempre vai fazer questão de lembrar como as pessoas depreciam a natureza do esporte e da competição. A única diferença do caso que envolveu Alonso e Massa é que o primeiro disputava de fato o título contra as Red Bull de Webber e Vettel e a McLaren de Hamilton ponto a ponto, tanto que o espanhol perdeu o título empacado atrás de Petrov naquele GP de Abu Dhabi. A Mercedes tinha tudo isso em mente. E tinha duas opções que são meio óbvias de explicitar: fazer ou não fazer. E, sim, fazer SEMPRE foi considerado.

Digo isso porque Wolff chegou a dizer que jamais havia considerado tal possibilidade. Vocês acham mesmo que uma organização tão complexa e competente como a Mercedes ia fazer uma reunião depois da classificação e em nenhum momento colocasse ali no papel um plano A ou B com Bottas cedendo a posição para Hamilton seja qual fosse a situação? Mentir é só um adendo à canalhice promovida. Se vai fazer, e consta lá que o negócio é fazer, assume e pronto. E se vai fazer, que se faça de uma forma inteligente e sutil; nos boxes, por exemplo.

A opção não fazer era simplesmente grandiosa. Primeiro porque não era em nenhum momento necessária em termos matemáticos: Hamilton abriria mais 3 pontos para Vettel, elevando a 43 sua imbatível diferença para ser heptacampeão; segundo porque a alegação dada, de que havia uma bolha no pneu, em nada interferiu o desempenho do inglês – e, sendo quem é, poderia muito bem ter se defendido de eventuais ataques de Vettel; terceiro, e principal, porque demonstraria, em tempos de tanto ódio, dissabor, injustiça e esperteza, que vencer tem seus méritos próprios e que perder pode dar até maiores conquistas do que ganhar. A Mercedes passaria uma mensagem clara nesta F1 envolta por ordens: o primeiro piloto tem de ralar para ganhar uma corrida em cima do segundo e, mesmo que o título não venha, a marca tem valores claros e sólidos dentro de uma competição que, sim, é de uma equipe, mas, igualmente, de dois competidores.

Bottas iria ganhar a corrida e a Mercedes seria ovacionada pelo seu fair play. Wolff, alegadamente, optou pela opção de ser maldoso para não ser idiota no fim do ano. Não deve ter pensado que passou a ser idiota para todo e sempre desde então.

Sobre os dois pilotos: também saem perdendo bastante. Bottas, menos, porque soube até ser inteligente ao cobrar, no fim da corrida, a inversão das posições, explicitando que havia, sim, um acordo prévio e que não fora cumprido. Mas Valtteri já tem culpa no cartório por ser um gado que aceita ser tocado conforme a vontade do pastor: se tivesse firmeza e personalidade, já teria podado desde o GP da Alemanha, por exemplo, quando tinha mais carro e aceitou caladinho não passar Hamilton para vencer. Depois, ficou chateadinho quando foi chamado de ‘escudeiro’ pelo chefe na Hungria. Já Hamilton… ele não precisava daquilo. E, como o chefe, já que fez, que não venha com aquele mis-en-scène de não querer falar com Paul di Resta ao descer do carro, de chamar o companheiro para o primeiro lugar no pódio, de querer trocar o troféu, de dizer que não queria aquilo. Assume, bonitão, assume que fez um papel horrível. E depois não adianta vir pedir desculpas via Stories para os milhares de fãs contrito e pesaroso: como a Mercedes, Hamilton é uma marca e um legado. Perdeu igualmente.

Parabéns a Hamilton pelo pentacampeonato. É um dos maiores pilotos de todos os tempos. Pena que deixou levar o carimbo que acertou a testa de Schumacher. Não tem removedor que o tire.