Blog do Victor Martins
F-Indy

Wilson e o que é preciso fazer

SÃO PAULO | A morte sempre é devastadora no esporte que a gente vive desde moleque. É pior ainda quando se está envolvido com as personagens. E não é qualquer um. Wilson é do tamanho de Bianchi, ainda que seu 1m93 não lhe faria nunca um piloto bom. Sua capacidade correspondeu à altura. Seu caráter, […]

SÃO PAULO | A morte sempre é devastadora no esporte que a gente vive desde moleque. É pior ainda quando se está envolvido com as personagens. E não é qualquer um. Wilson é do tamanho de Bianchi, ainda que seu 1m93 não lhe faria nunca um piloto bom. Sua capacidade correspondeu à altura. Seu caráter, idem.

Wilson também era meio desengonçado por sua timidez, que não lhe fazia esconder o sorriso. Rapaz do agradecimento rápido quando era elogiado — sempre —, procurava disfarçar mudando o assunto. Não havia um ser ali no grid da Indy ou até mesmo com quem conviveu na F1 que fosse capaz de lhe dizer um algo negativo.

Era inconcebível ver Wilson fora do grid neste ano. Com uma Dale Coyne pedinte, fez miséria, e quando a miséria bateu mesmo à porta da equipe, viu-se sem um lugar fixo. Foi Michael Andretti quem lhe abriu as portas de suas várias casas e ver que ganhava um ente num estalar de dedos. Da E à Indy, buscava uma fórmula para sobreviver no automobilismo. Quis o destino, mais uma vez, acabar com esta prova desnecessária.

A morte foi confirmada às 10 da noite no nosso horário noturno, mas vão aí algumas infos de bastidores que agora são permitidas dizer. Na noite de domingo, Wilson passou por uma cirurgia na cabeça, com a ciência dos médicos de que suas chances de sobreviver eram menores do que 10%. Justin morreu na tarde de ontem, começo da noite por aqui, e a demora em divulgar a informação se deu porque a família quis estar toda reunida no hospital da Pensilvânia enquanto a notícia saísse da Economaki Room, a sala de coletiva de imprensa do Indianapolis Motor Speedway.

Wilson talvez seja a vida cabal para modificar alguns conceitos enraizados no automobilismo. Foi com Bianchi, também foi com Wheldon — sua cabeça bateu no alambrado quando decolou há quase quatro anos em direção ao alambrado de Vegas —, com Surtees, quase foi com Massa. Os carros de monopostos estão seguros demais, e isso não precisa ser revisto. Mas não se pode mais passar batido em nome de tradição alguma que pilotos estejam morrendo com estas pancadas.

Evidente que todo mundo sabe que automobilismo é um esporte de risco. Só que não é com este dogma que todo mundo tem de cruzar os braços e aceitar que há uma vulnerabilidade mortífera. E nem por definição que um cockpit fechado — ou qualquer definição que se dê a uma eventual proteção — vá modificar a natureza de um monoposto (um lugar) ou open-wheel (rodas abertas/descobertas).

A F-E tem nos ensinado algumas lições em relação a isso. É claro que todos os puristas e amantes de velocidade torcem o nariz quando ouvem um trem de força que se assemelha ao som de um processador ou triturador e um carro que não atinge a maior quilometragem por hora. Só que, ao fim e ao cabo, o que nós gostamos mesmo é de competição, de corrida pura, de ultrapassagem, de emoção e de disputa. E é por isso que a categoria de carros elétricos acabou caindo tanto no gosto popular. É meramente uma questão de costume se habituar com uma categoria que nasceu diferente.

“Ah, mas a F1 e a Indy não são diferentes, não podem ser diferentes”. Amigo, a ocasião pede mudança. É preferível uma capota bem desenhada e protetora e o desgosto de alguns do que o desgosto geral pela morte de um daqueles que nos fazem gostar deste espetáculo. Se houver uma solução melhor que a cobertura, que então seja aplicada. O que não se pode mais é deixar quieto em nome do passado.

Até porque há muitas coisas do passado que já foram modificadas e são muito mais tenebrosas do que uma simples proteção de cabeça. E o mundo segue o mesmo. Só que sem Wilson e Bianchi.