Blog do Victor Martins
F1

Spa Relax Francorchamps Elisées, 3

SÃO PAULO | Poderia ver setecentas e catôze vezes a imagem da repetição do choque que não veria qualquer intenção deliberada de Rosberg em bater em Hamilton na volta 2 do GP da Bélgica. Um incidente de corrida até comum em que partes de asa se vão, furos de pneu acontecem, e a vida segue. […]

SÃO PAULO | Poderia ver setecentas e catôze vezes a imagem da repetição do choque que não veria qualquer intenção deliberada de Rosberg em bater em Hamilton na volta 2 do GP da Bélgica. Um incidente de corrida até comum em que partes de asa se vão, furos de pneu acontecem, e a vida segue. Como aconteceu, sem uma menor carga de atenção, no encosto que Alonso deu em Vettel na magnânima briga do fim da corrida que envolveu também as McLaren de Button e da muralha danesa Magnussen. A coisa ganhou corpo porque, em primeira instância, Hamilton se deu bem mal e, no outro extremo, Rosberg fez importantes 18 pontos para o negócio; na da equipe, a Mercedes não levou para casa uma dobradinha fácil.

Em meio às vaias do público ao alemão, o inglês já estava sendo irônico com a felicidade do companheiro e espumava, seu chefe #1 (Wolff) saiu dizendo que a situação era inaceitável e o #2 (Lauda) defendeu Hamilton, desgostoso com a precipitação do outro piloto. Até o #3 (Lowe) deu o pitaco e agregou ao coro unânime. Espalharam que haveria uma reunião de emergência. Depois do encontro, Lewis saiu dizendo que o parceiro era réu confesso de seu ato em bater para “mostrar que estava certo”. Aí a Mercedes confirmou as palavras de Hamilton e, na sequência, tentou amenizar, com o eufemismo de que Rosberg foi mal-interpretado e quis dizer que optou por não evitar o choque.

O primeiro grande problema da Mercedes, na verdade, é a total inabilidade de gerenciamento, e não só de seus pilotos. A Mercedes está perdida: se do primeiro problema, em Mônaco, soube sair até que bem, na Hungria começou a demonstrar que não agia conforme seu discurso e não pôs as rédeas necessárias para evitar que nenhum de seus membros pusesse as manguinhas de fora e saísse com rusgas de uma outra prova que não soube ganhar. Afinal, o que entende por ordens de equipe? Suas estratégias são soberanas e de total conhecimento de ambos? Quem é que manda no negócio definitivamente? Às vezes, não é melhor ficar quieto?

O processo de fritura de Rosberg antes mesmo da conversa com o próprio beirou o ridículo. Se deixou seus pilotos realmente correrem, não tem por que cobrar de Nico que esperasse uma ou duas voltas mais para atacar o parceiro. Se houve o toque, que esperassem para resolver a situação entre portas fechadas antes de arrombá-las. Se ouviram as partes, que evitasse que a vítima da situação pussesse mais fogo no incêndio. Se não quisessem a destruição, que não tivessem então assentido as palavras para depois amenizá-las. E é claro que há uma crise, uma cizânia e um cenário de descontrole generalizado. O descostume de lidar com as derrotas é muito maior que o das vitórias.

E nisso, então, surge a dúvida: Rosberg agiu realmente de forma deliberada para ter o choque, para provar alguma razão? E qual razão: que era mais rápido naquele momento ou é ainda resquício de alguma coisa da etapa antes das férias? Porque o rescaldo da desgraça coloca em xeque o caráter dos dois pilotos. Hamilton não é flor que se cheire, sabe-se, mas foi sincero ou aumentou o caso para sair por cima, respaldado pela equipe? Rosberg foi apenas duro e demarcou território ou quis mesmo demonstrar algo? Wolff diz que sim e que não. Nico não tocou no assunto.

Digamos que Rosberg tenha tido realmente intenção. Bem, eu imagino que qualquer empresa que tenha um funcionário preocupado em fornicar com a vida de seu colega o mandaria embora. Se alguém do Grande Prêmio começasse, sei lá, a fazer corpo mole para deixar todo o trabalho na mão dos demais jornalistas ou que fizesse fuxico para criar um grupinho ou patota em detrimento de outro, seria enxotado sem direito a até logo e participação na festa de 20 anos. Até porque, como é que se convive com alguém em quem não se tem mais confiança? Se Rosberg fez isso hoje, significa que pode ter feito também na classificação em Monte Carlo, e todas as suas ações passam a ser revistas.

No fim das contas, este campeonato começa a se parecer com o de 2007, quando teve aquela altercação imensa na McLaren com Alonso e, puxa vida, Hamilton. Outro ponto em comum é que a Hungria esteve presente na história. Os dois, que disputavam o título, acabaram perdendo-o para Räikkönen e a Ferrari – que agora são bem representados por Ricciardo e a Red Bull – aliás, aqueles 18 pontos que lhe foram tungados na Austrália começam a fazer falta. Se a Mercedes perder esse campeonato, a primeira coisa que me vem à cabeça é dizer um bem feito com gosto.

Prefiro mais a elegância e o sorriso de um moleque que deixa a gente rir com ele do que essa gente que, quando abre a boca, não tem certeza do que diz nem sabe o que faz.