Blog do Victor Martins
F1

Pelo direito de comer

SÃO PAULO | É bem sabido que vivemos tempos de súper e auto-exposição o tempo todo pelas diversas redes sociais que nos são oferecidas. ‘Selfies’ viraram temas de longas reportagens nos mais importantes veículos — também denotando a falta de critérios e ideias jornalísticas, mas é papo pr’outra hora — e fotos e frases passaram […]

SÃO PAULO | É bem sabido que vivemos tempos de súper e auto-exposição o tempo todo pelas diversas redes sociais que nos são oferecidas. ‘Selfies’ viraram temas de longas reportagens nos mais importantes veículos — também denotando a falta de critérios e ideias jornalísticas, mas é papo pr’outra hora — e fotos e frases passaram a ser usadas como notícias e verdades mais do que absolutas.

Mas uma imagem no Instagram de Jean-Éric Vergne agora há pouco é simbólica, reflexiva e muito mais que uma notícia.

A princípio, imagina-se que Vergne seja o mais novo garoto-propaganda do McDonald’s ou que apenas estranhou a linguagem árabe na fachada da loja. O francês está no Bahrein e andou hoje com o carro da Toro Rosso, terminando os últimos testes coletivos em segundo. A postagem contém uma frase única, “diet is finished”, seguida do emoticon que representa alegria sincera, corroborada pelo ‘hehehe’.

Ser piloto de F1 no regulamento atual tornou-se uma tarefa árdua não só porque os pneus e combustível têm de ser controlados, bem como o peso. Se as equipes não conseguem fazer seus carros pesarem o mínimo de 692 kg, descontam nos pilotos, e aí são eles que se veem obrigados a gastar: as calorias; e é claro que os mais altos e ósseos sofrem mais.

Sutil, o mais pesado de todos, abriu a cruzada contra a categoria do regime eterno e expôs uma situação grave: a de que alguns pilotos, como ele, não estavam se hidratando durante o desgastante e quente GP da Malásia. Button, 6% de gordura para baixo, quase denota em seu semblante uma anorexia profunda. À grita, o presidente da FIA, depois de se entupir de brioches e croissants contígua à Place de la Concorde, desdenhou e disse que dieta alguma leva piloto para o hospital, escarrando sua ignorância.

Naquele fim de semana em Sepang, o comentarista Martin Brundle disse durante a transmissão da britânica Sky Sports que um piloto chegou a desmaiar durante um evento promocional de sua equipe, sem mencioná-lo. Sem a revelação confirmada por quem quer que seja, um nome havia sido especulado: o de Vergne.

Não é meramente uma questão de gula ou satisfação da saciedade, comer um pudim ou bater uma massa em um domingo sem corrida. Todt e quem quer que tenha feito o regulamento não se deram conta de que este é, sim, um item de segurança. Um piloto desidratado ou mal alimentado para se manter magro e ganhar décimos pode ter um mau súbito durante um treino ou uma corrida. Vira um perigo absurdo e insano, além de desnecessário. Mais do que a preocupação de um bom espetáculo, de uma categoria igualitária ou de um som melhor de motor, os dirigentes deveriam ouvir as vozes da maioria e aumentar este peso mínimo de modo que não sejam os protagonistas os afetados da história.

A foto de Vergne não é um ‘selfie’ nem é uma indireta, mas grita e informa: comer um nº 1 com Coca-Cola não pode se tornar um peso psicológico nem ser crime com castigo perpétuo.