Blog do Victor Martins
F1

O maniqueísmo dos testes coletivos

SÃO PAULO | Finalmente, meu povo, é hoje que a bagaça retorna aos nossos olhos. Todo ano, a gente fala que a expectativa é grande, mas nunca antes na história desta categoria, pelo menos nos últimos cinco anos, a expectativa tem sido tão grande assim. Primeiro porque muda tudo, e até todo mundo se ambientar […]

SÃO PAULO | Finalmente, meu povo, é hoje que a bagaça retorna aos nossos olhos. Todo ano, a gente fala que a expectativa é grande, mas nunca antes na história desta categoria, pelo menos nos últimos cinco anos, a expectativa tem sido tão grande assim. Primeiro porque muda tudo, e até todo mundo se ambientar – nós e eles –, vai um tempo; o novo sempre atrai. E porque, para Brasilino Pacheco e os torcedores locais, Massa aparece com boas chances de se dar bem, nessa Williams à la Brawn pintada de Martini – o retrô sempre atrai.

E neste maniqueísmo de atração é que vamos verificar se os testes de pré-temporada enganam ou trazem a realidade. E, sim, os resultados destas primeiras semanas de treinos também provocam uma dicotomia. Eis um levantamento dos últimos cinco anos:


Mercedes e até McLaren apareciam bem nos testes de 2013, que escondiam Vettel

Quem apenas olhasse para os tempos de volta jamais cravaria que Sebastian Vettel teria vida fácil na temporada do ano passado. A última rodada de testes coletivos, realizada no mesmo período deste ano, mas em Barcelona, havia colocado a Mercedes como a mais rápida dentre todos, sobretudo nos dois dias finais, liderados por Lewis Hamilton e Nico Rosberg, respectivamente. Eram programas diferentes realizados por Red Bull e Mercedes, é verdade, mas a diferença no cronômetro se fazia exorbitante aos olhos de que nem estava preocupado com isso: quase 2s4 entre os alemães das mencionadas equipes.

Na sessão da semana anterior, também rodada na Catalunha, Sergio Pérez punha a McLaren como destaque no agregado dos tempos. Fernando Alonso, Nico Hülkenberg — então na Sauber — e Romain Grosjean apareceram na frente de Vettel. Quando andaram em Jerez pela primeira vez com os carros de 2013, Felipe Massa e Kimi Räikkönen — que corriam por Ferrari e Lotus à época — dominaram as sessões. Vettel foi novamente o quinto no geral.

Räikkönen começou o ano na Austrália com vitória, Massa teve bom desempenho naquela prova junto com Alonso. Vettel sofreu para ir ao pódio. Melbourne, na verdade, ficou fora da curva do campeonato, e só a Mercedes teve lampejos de grandiosidade confirmados na primeira metade da temporada. Os testes — ainda mais considerando o que foi a McLaren e o início da Sauber — só se fizeram valer, mesmo, na Austrália. De resto, camuflaram.

Campeão de 2012 saiu da pré-temporada em que posição? Isso mesmo, último

A temporada retrasada teve sua decisão excepcional – mais uma – em Interlagos, com a presença de uma garoa que ditou o ritmo da prova. No fim das contas, Vettel arrancou para o título com uma sequência de vitórias na segunda parte da temporada – não como a do ano passado – e bateu outra vez Alonso. E pensar que o alemão foi o último colocado da última sessão de treinos daquela pré-temporada em Barcelona, enquanto o espanhol tomava tempo de Lotus (Räikkönen), Sauber (Pérez), McLaren (Button) e até Toro Rosso (Ricciardo). Os três primeiros fizeram um campeonato deveras decente, de fato.

E nas baterias anteriores, só para constar, Vettel foi sexto em Jerez e quinto em Barcelona. Sempre atrás de Alonso.

Em 2011, desempenho nos treinos coletivos até apontava prenúncio de domínio

Aquela pré-temporada foi a última que teve uma quarta semana de testes embutida. Uma primeira olhada nas estatísticas que trazem seus respectivos líderes já aponta um cenário ‘comum’: não aparece o nome de Vettel. Mas até que o alemão teve desempenhos que corresponderam ao domínio que apresentou em 2011. Na primeira sessão em Valência, liderou o primeiro de dois dias em que treinou, terminando em quinto no geral; na seguinte, em Jerez, já não foi lá essas coisas: 14º no agregado; quando apareceu em Barcelona, foi o mais rápido em ambas as práticas, terceiro no geral; para finalizar, ponteou a tabela de tempos uma vez, novamente sendo quinto no total – nota: Michael Schumacher foi o melhor daquela semana com a Mercedes.

Vettel nadou de braçada para conquistar seu segundo título no Japão, quatro provas antes do fim do campeonato. Foram 122 pontos a mais que Button.

Alonso e Hamilton apareciam com força em 2010, ano do primeiro título de Vettel

Quem acompanhou os testes de 2010 tinha bastante confiança de que a disputa pelo título ficaria entre Alonso, líder geral em Valência, e Hamilton – o melhor nas duas semanas em Jerez e em Barcelona. O negócio estava feio para Vettel – coisa de mais de 1s5 de diferença no começo, considerando do segundo testes em diante, que se reduziu a 0s6 no fim, levando em conta as diferenças para os mais rápidos que enfrentava na pista. O companheiro Webber aparecia mais em forma, andando no ritmo de Lewis.

Os quatro chegaram a Abu Dhabi, a prova final, com chance de título. Hamilton tinha chances remotas, Webber era o segundo no campeonato já sem as forças que havia mostrado durante 3/4 da competição e Alonso empacou em Petrov, ajudando a coroar o jovem alemão em um ano de algumas mudanças significativas: a proibição do reabastecimento e dos testes durante a temporada, o ano sabático do Kers, o uso dos pneus do Q3 para a largada e a mudança no sistema de pontos que passou a premiar os dez primeiros colocados.

2009: surge do nada a Brawn e papa o título

Bom, um campeonato que uma equipe surge às pressas e vence só pode ser considerado atípico – ainda que se saiba que deixaram a Brawn correr com algumas peças que pareciam proibidas para as outras… O espólio da Honda fora adquirido por seu chefe de equipe em um ano em que a liberdade de testar era imensa: foram contabilizadas 20 sessões em que as equipes se dividiam como bem entendiam. A Brawn só participou das últimas três. Na primeira delas, foi Rubens Barrichello quem apareceu na primeira colocação geral da sessão que contou com grande parte das equipes, liderando o último dos quatro dias de treinos em Barcelona. Button foi o segundo, melhor no terceiro dia. Os dois não andaram no encerramento da pré-temporada, sendo substituídos, vejam vocês, por Mike Conway e Marcus Ericsson – que só foi conseguir vaga como titular agora pela Caterham.

Assim, não se pode negar que a Brawn tinha pinta de que podia andar entre os primeiros. As seis vitórias nas sete primeiras provas do ano encaminharam o título de Jenson em um ano que representou a então última grande guinada no regulamento técnico da F1, com a proibição de todas as aletas e penduricalhos possíveis que eram vistos nos carros até o ano anterior e a volta dos pneus slicks à competição, além de mudanças nas dimensões das asas dianteira e traseira e do difusor, e da introdução do Kers.