Blog do Victor Martins
F1

O outro beijo gay

SÃO PAULO | Cerca de quatro horas antes da abertura oficial das Olimpíadas de Inverno de Sochi, a Lotus tirou um pouco das atenções que se voltaram ao seu shakedown e filmagem do E22 em Jerez para lembrar o evento multiesportivo. Sempre ao seu modo bem humorado e sarcástico, a equipe usou as redes sociais […]

SÃO PAULO | Cerca de quatro horas antes da abertura oficial das Olimpíadas de Inverno de Sochi, a Lotus tirou um pouco das atenções que se voltaram ao seu shakedown e filmagem do E22 em Jerez para lembrar o evento multiesportivo. Sempre ao seu modo bem humorado e sarcástico, a equipe usou as redes sociais — no caso, o Twitter — para passar a mensagem:


Não demorou muito para que a postagem fosse prontamente reproduzida e, em sua maioria, aplaudida e elogiada por grande parte dos seguidores ou por quem mesmo acompanhou ao largo. Há, no entanto, duas questões que podem atrapalhar (ainda mais) a Lotus na paz de seus dias neste ano.

Primeiro que a F1 não é muito afeita a inclinações ou manifestações políticas feitas por qualquer um de seus membros. A foto de um casal gay se beijando bate profundamente de frente com os costumes russos, que ao longo destes últimos tempos reprimiram qualquer manifestação entre iguais dentro ou fora dos Jogos. O caso mais célebre de como a categoria é ensimesmada e dá de ombros para o que acontece no mundo é o do GP da África do Sul em Kyalami em meio ao estúpido apartheid. No ano passado, a mesma Lotus chegou a ser repreendida por ter postado a foto de uma cópula — estou educado e polido hoje — de coelhos para falar da saída de Räikkönen rumo à Ferrari. Geralmente, as instituições esportivas se afastam de problemas desta natureza porque pouco tem a ganhar com apologias e defesas.

E tem também a consequência direta: a mesma Sochi vai ser palco do primeiro GP da Rússia da história daqui oito meses. O povo lá deve estar bastante preocupado a essas horas com a cerimônia que dá a largada às competições, mas certamente há de ficar sabendo que uma equipe de F1, aquela que já teve um dos seus, Petrov, é contra seus princípios sexuais. E sabemos bem como o povo do Kremlin/Moscou e região age.

E só um outro fato no imbróglio, por assim dizer: parte da Lotus acabou de ser passada à Yotaphone, uma companhia de comunicação da Rússia.

O beijo gay — sequência de selinhos; vivemos entre pudicos e moralistas — que na semana passada atiçou um país no fim de novela pode provocar consequências indesejadas a um time que já sofre por sua condição financeira e, por consequência, pela sobrevivência. A cartilha universal da vida incita o silêncio e pune os rebeldes e desvirtuados, sobretudo em questões delicadas como homossexualidade.

Não parece, mas vivemos em 2014 neste mundinho aí, segundo o calendário gregoriano.

Adendo: Por volta das 15h45, a Lotus deu pra trás, apagou seu comentário no Twitter e escreveu que post foi uma ‘mensagem não autorizada’:

Que pena ter se acovardado e arregado desta maneira. O exemplo dado antes, uma mensagem tão simbólica quanto a do Google, vira vergonha pública.