Blog do Victor Martins
F1

La Comunitad, 3

SÃO PAULO | Tem alguém perto que está ouvindo a rádio Iguatemi até o talo, e lá passa um programa só com músicas do Roberto Carlos. “Eu tenho tanto pra lhe falar”. Verdade. Tem muita coisa. Primeiro que Valência não dá. Difícil que haja uma corrida tão ruim até o fim do ano. Nem com […]

SÃO PAULO | Tem alguém perto que está ouvindo a rádio Iguatemi até o talo, e lá passa um programa só com músicas do Roberto Carlos. “Eu tenho tanto pra lhe falar”. Verdade. Tem muita coisa.

Primeiro que Valência não dá. Difícil que haja uma corrida tão ruim até o fim do ano. Nem com todo o blush, rímel e batom que a F1 aplicou para dar uma chacoalhada no espetáculo foi possível assistir sem pensar na hora e meia perdida e nos braços do Morfeu. Porque justamente Valência foi criada de forma maquiada: ser uma nova Mônaco para que os ricões atraquem seus iates luxuosos numa corrida de rua que teoricamente permite ultrapassagens, 60 e tantos por cento de aceleração plena, áreas de escape, blé. Em quatro edições, Valência já criou a tradição de ser um puta saco. Ninguém abandonou. Uau, recorde histórico. Sabe aquele ditado de que não se deve confiar em gente que não bebe? Não acredite em corrida em que ninguém abandona. Ainda, não acredite numa corrida em que o mito Kobayashi não termina nos pontos e não vai bem.

E não acredite, também, em tudo que se ouve. Coisas como Massa perdeu a vitória hoje. Todo santo domingo de corrida tem sido um editorial de explicações de uma defesa desnecessária, que elimina qualquer caráter jornalístico e racional e considera meramente o patriotismo e as relações pessoais hiperbólicas. E como a Ferrari não tem feito o seu trabalho dos boxes, fica muito fácil entregar o filho nas mãos de um mecânico que se atrapalha na troca de um pneu. Foram 5 segundos nos boxes. Felipe terminou 51 atrás de Vettel. Tomou 40 de Alonso. Massa só fez bem a largada. A partir de então, só andou para trás — até se imaginou que partiria para uma tática diferenciada de paradas; nada; mesma coisa. É um feito e tanto Alonso terminar entre as Red Bull. Ô se é. E já que se explica tanto por que Massa está sempre de quarto para cima, seria de bom grado explanar por que Massa não alcança tais feitos. Como a verdade dói, ela é omitida.

Alonso é melhor que Massa. Qualquer outra lavagem cerebral é lobotomia.

Como Vettel é melhor que Webber. Que mal tem nisso? E, sim, as comparações têm de ser feitas em esportes e competições. Um tem de ser melhor que outro. A diferença entre Vettel e Webber é similar à de Alonso e Massa. Há três meses, escrevi isso numa parte da análise da temporada 2011: “(…) o australiano Webber e o brasileiro Massa, de países continentais com histórico notável na F1, Brabham e Jones para um lado, Fittipaldi, Piquet e Senna para o outro, um sem ser campeão há três décadas, outro há duas. Quando Webber estreou em 2002 pela Minardi, lá estava Massa, também em sua primeira corrida, com uma Sauber. Os dois passaram muito perto do título: Webber o perdeu no ano passado na última prova e Massa, em 2008, na última curva. Acidentes marcaram as carreiras: a clavícula quebrada de Webber depois de cair de bicicleta foi decisiva para sua derrota em 2010; a mola que atingiu a cabeça na classificação do GP da Hungria tirou Massa de combate durante o resto da temporada de 2009. Inegavelmente bons, nem Webber nem Massa têm arroubos de pilotos fora-de-série, contudo, e diante de Vettel e Alonso, respectivamente, são vistos na maioria como segundões.”

É isso. Nem Massa nem Webber são maus pilotos. Só não têm condições de acompanhar seus companheiros. Há algum pecado em ser pior do que o cara com quem se divide garagem? A Ferrari e a Red Bull não ouvem Cássia Eller e ficam a cantarolar, em Maranello ou Milton Keynes: “Eu vou sabotar / você vai se amarrar”. Ninguém gasta milhões em salário para ferrar com a vida alheia.

Salvo engano, Webber e Massa não usaram a asa móvel hoje — só na reta em que estava liberada independente da distância para o carro da frente. Quer coisa mais abissal que essa? Quando foi liberada pela direção de prova, o australiano já estava mais de 1 segundo atrás do companheiro, tal como Massa. Aí em nenhum outro momento da corrida diminuíram a diferença para ninguém à frente — e Webber, pior, nem mesmo quando foi ultrapassado em pista por Alonso. Convenhamos que, nestes tempos de F1 com possibilidade de ultrapassagem, ainda que seja em Valência, esse horror, alguém que queira ganhar posição ou vencer uma corrida em que ninguém abandona tem de usar o DRS.

Assim, cai por terra a tese de que Massa perdeu a chance de vitória por seus 5 segundos perdidos nos pits, por exemplo.

Sobre Vettel, não há muito o que dizer. Tão logo foi informado de que o parceiro-barreira fora superado por Alonso, impediu sua aproximação. Simples. Apertou o da direita, e aí, o espanhol não tinha o que dar mais à sua torcida a não ser o segundo lugar. E acabou. Acabou o campeonato. Para o próprio Alonso, que tinha de chegar à frente do futuro bicampeão para sonhar o sonho impossível, mas que já deve estar com os pés no intransponível chão de que não há mais o que fazer. A Ferrari — e também a McLaren — deveriam usar 2011 apenas como forma de desenvolvimento das peças dos modelos de 2012.

Na McLaren, Hamilton, de forma mais evidente, e Button ficaram putitos porque não tiveram em nenhum instante como acompanhar a Ferrari, que dirá a Red Bull. A cúpula alega que foi o superaquecimento dos pneus que os tirou de combate e que voltarão com força na Inglaterra. Mas nenhum dos dois pilotos foi bem hoje, Button principalmente.

A Mercedes é simplesmente uma piada em corrida, e não cola mais o papo de que ainda sofrem as consequências do esforço hercúleo do título de 2009 quando ainda era a Brawn. A Lotus Renault caiu demais, e Heidfeld e Petrov não ameaçam sequer a Mercedes e começam a brigar com Sauber, Force India e Toro Rosso — que novamente pôs Alguersuari num oitavo lugar, novamente recuperando-se de uma péssima classificação, utilizando-se de uma estratégia diferenciada. É a sobrevida, o respiro do mediano piloto espanhol no segundo time energético. Sutil fez sua melhor corrida no ano e foi nono, mas nada que deva fazê-lo ficar no grupo dalit.

A próxima corrida é Silverstone, onde o ritmo das provas anteriores, com alguma emoção, deve ser retomado. Do segundo lugar em diante, obviamente. Qualquer coisa diferente disso se torna uma exceção nesta temporada que já tem dono.