Blog do Victor Martins
F-Indy

Anhembindy, 14

Clique aqui ▼    ANHEMBI | O fim de semana de cinco dias chegou ao fim, e este não é propriamente um último post direto do Anhembi, mas ainda estou próximo à região e me permito esta licença poético-geográfica. Jornalisticamente falando, cobrir um evento como este da Indy é exaustivo pelas demandas inerentes, ainda mais para um […]

Clique aqui ▼ 
 

ANHEMBI
| O fim de semana de cinco dias chegou ao fim, e este não é propriamente um último post direto do Anhembi, mas ainda estou próximo à região e me permito esta licença poético-geográfica. Jornalisticamente falando, cobrir um evento como este da Indy é exaustivo pelas demandas inerentes, ainda mais para um site, que lida com notícias contra o tempo. Mas não tem nada do papo furado da validade da credencial que foi escrito em uma página supostamente famosa lá fora, feita em português, por um “profissional” supostamente cansado por natureza. O resultado que fica é sempre de um trabalho digno. A Indy permite isso. Daí, principalmente, eu gostar bem mais dela do que da F1.

Nos mais amplos sentidos, a Indy dá a todos uma aproximação maior. É claro que não é bem uma festa do povo, como apregoou em determinado momento a TV Bandeirantes, copromotora do evento, e ainda falta muito para ser um “belíssimo espetáculo”, como se fosse uma ópera com um grid de 26 tenores. Mas se a referência é a F1, a Indy, a prefeitura, a emissora e todos aqueles que estiveram na organização do evento realmente ganham um ponto a favor. E meus caros colegas não podem reclamar da liberdade que tiveram para entrevistas e conversas com quem quer que fosse. Pilotos e dirigentes estavam disponíveis. É muito mais fácil falar com um Dario Franchitti ou um Will Power do que com um Timo Glock, e as respostas rendem boas histórias e manchetes, sem a pasteurização paunocuzística da categoria-mor.

Assim, legal demais que se tenha uma corrida de Indy por aqui. Que venha uma segunda, em Porto Alegre, uma terceira na praia de Boa Viagem, etc.

Mas vou me pegar no ponto do belíssimo espetáculo, dito por Fred Nogueira, vice-presidente da Bandeirantes, ontem na coletiva de imprensa pós-adiamento da prova. Entendo por belíssimo espetáculo algo impecável em absolutamente todos os sentidos. Por impecável, entendo que não haja ressalva alguma. E em muitos pontos há falhas graves.

Primeiro que a sala de imprensa não pode ficar desprotegida às quintas-feiras. São dois anos de episódios de roubos. Nenhum profissional é obrigado a ter receio de deixar seu equipamento no lugar demarcado para ir ali ao pavilhão para falar com James Jakes, à lanchonete comprar uma esfiha de calabresa de 4 dinheiros ou mesmo ao banheiro — apesar de jornalista não ter selo de moralidade; tem nego pra tudo, e levar as coisas alheias não é de todo estranho. Mas que se evite, de modo geral. Sexta-feira colocaram lá as catracas, e o problema estava resolvido. Só não poderia ter repetido o erro do ano passado. Na minha terra, isso se chamaria burrice.

O fato de a corrida ser em São Paulo é um problemaço. O prefeito Gilberto Kassab esqueceu há muito tempo que administra uma megalópole próxima de um colapso para se concentrar na criação de seu partido e costurar alianças com gente que não sabe se é direita ou esquerda na vida. Normal, então, que estivesse meio perdido em relação a pontos interessantes, como gastos e obras feitas, mas devidamente afiado para rasgar seda e saponáceo para debater os pontos falhos. Mais normal que não tivesse pensado que a corrida poderia acontecer numa segunda-feira. Mas como a Indy é um evento que, segundo os números oficiais mirabolantes, é altamente lucrativo, tem de se fazer e pronto.

Para não ferrar a vida do cidadão em dia útil, faz-se tudo em dois dias. A programação piora por ser inflada pelo GT Brasil, evento transmitido pela mesma emissora. Juntam-se dois eventos automobilísticos, que vão de 7h30 até o começo da noite, no caso do sábado. Fica puxado para todo mundo, inclusive para o público. E aí, qualquer fato que tire algo da linha vira uma hecatombe em duas vias. A tempestade dominical acabou por ferrar a vida de todos. Há de se repensar nisso: se são dois dias, mesmo, que se deixe tudo para a Indy. Apesar de o povo ter um apreço e conhecimento muito maior pela F1, a categoria se sustenta por si.

Um aparte: havia, mesmo, 41 mil e tantas pessoas nas arquibancadas no domingo? Os espaços em branco não representavam só 5 mil gentes. É apenas uma leve desconfiança. Mas nada que pese. Gabar-se por mais ou menos cabeças sentadas no concreto ou tratadas a acepipes nos camarotes não é da nossa alçada.

Um segundo aparte: Luan Santana. Era batata que entre o brado retumbante ouvido às margens plácidas do Ipiranga, salve, salve, o povo encaixasse um viado às margens do Tietê. É claro que a organização não tem controle, e não tem de ter, para o que o populacho grita durante um hino, mas, enquanto belíssimo espetáculo, havia opções muitíssimo melhores.

O asfalto. Bom, primeiro que foi feito semanas antes da corrida. Não houve tempo para que curasse devidamente, pois. Falaram que usaram a mistura que deu um jeito em Interlagos há alguns anos. Depois do que aconteceu domingo, com poças imensas e uma atração curiosa para concentrar água em si, é muito mais além do que uma leve desconfiança. Gostaria de ver algum relatório ou especialista — tá na moda, tem especialista para tudo hoje — que me prove que houve realmente um plano e um cálculo sobre o pixe e que apresente um tópico especial para escoamento.  Fosse o asfalto padrão Interlagos, a corrida teria acontecido no domingo no período em que a chuva era constante porém propícia à prática esportiva.  

Uma pista de rua com menos ondulações, nota-se, não é tudo. E dois anos com o mesmíssimo problema, disse acima, é burrice. Sobre o concreto do sambódromo, nenhuma queixa foi registrada. Só uma poeirazinha, mas é de menos. OK.

Por fim, a cobertura do evento. Primeiro que me incomoda o laço oportunista que é feito entre órgão público e emissora. O automobilismo brasileiro, aquele que está até a boca de coisas erradas, está diretamente atrelado ao meio de comunicação que o exibe. Acontece isso com a Globo e a F1 e a Stock Car. Acontece o mesmo com a Bandeirantes e a Indy e a Truck. Não são registradas críticas, e por mais que cada categoria tenha sua exigência e labuta, todas têm resultados vistos só no mundo de poliana. Nas condições de organizadoras, as TVs mandam a isenção e imparcialidade às favas. Corridas de carros acabam tratadas como o Carnaval do Rio ou de São Paulo ou o Band Folia e o Festival de Parintins, transformando os pilotos em mestres-salas e bois-bumbás. A única coisa em que são diferentes está no trato com os patrocinadores: uma omite, outra se rende. E no caso da Indy, em vez de notícias ou informações nos caracteres, surgem personalidades da casa ou famosos da vez para dar contribuição zero. Em vez de Ryan Briscoe, Bryan Riscoe, e James Hinchcliffe vira Jimmy Cliff, e não se sabe se Simona ou Simone tem sobrenome De Silvestro ou De Silvestre, e tem o Hi Hunter e o Sébastien Bordê, e Takuma Sato é o único japonês do automobilismo e não é conhecido no Brasil, e por aí vai.

Em suma: as TVs não olham para os pontos que os pilotos ganham na prova que estão disputando, mas para os que o ibope apresenta. E quanto mais altos, mais desfocam os olhos de seus diretores e permitem que só eles vejam que houve um belíssimo espetáculo. Uma prova que aconteceu mais de 60% em bandeira amarela, sendo que cinco voltas foram apenas para verificar se dava para haver disputa ou não, não é um espetáculo belíssimo. E não se pode colocar sob as asas da intempérie ou da sacanagem desse São Pedro danadinho que não deve curtir a Indy.

E aí a gente tem de dar ouvidos para a palavra final da TV americana, que encerrou a longa transmissão do domingo, meio enfadada, classificando aquilo como fiasco.

Siga-me no Twitter.