Blog do Victor Martins
Stock Car

A hora da mudança

SÃO PAULO | Vou começar as atividades de hoje com o desabafo, na íntegra, de Cássio Homem de Mello, que neste ano não corre a Copa Montana, mas que tem experiência longa nestes carros de turismo e a mesma faixa de idade de Rafael Sperafico e Gustavo Sondermann: “Vamos aos fatos: carro nenhum segura uma […]

SÃO PAULO | Vou começar as atividades de hoje com o desabafo, na íntegra, de Cássio Homem de Mello, que neste ano não corre a Copa Montana, mas que tem experiência longa nestes carros de turismo e a mesma faixa de idade de Rafael Sperafico e Gustavo Sondermann:

“Vamos aos fatos: carro nenhum segura uma porrada em T como essa. Nem o DTM que, diferente de criar taxas e regras para enfiarem mais dinheiro no bolso e não reverterem nada para segurança, por exemplo, principal item de necessidade do automobilismo. Quando digo organizadores, excluo TOTALMENTE o Gue e o Gerson, da Pick Up, pois são pessoas incríveis, que SEMPRE nos ouvem e tentam nos ajudar de verdade. Tô falando do resto que não vale nada.

Pela primeira vez na vida, senti medo de voltar a correr, não sei por quê. Será que vale a pena fazer meus pais correrem o risco de ficar como eu vi a família dos dois amigos que perdi?? Sei lá…só sei que “alguém” me tirou dessa corrida, por algum motivo. Por mais que eu tenha pensado MUITO nisso, ainda não cheguei à conclusão nenhuma. Só sei que pela primeira vez deu medo. O que não sai da minha cabeça é o mesmo silêncio ensurdecedor que presenciei, depois de três anos, em Interlagos. Isso eu nunca mais vou esquecer e espero nunca mais presenciar.

Já que a CBA não faz nada, peço que os pilotos ajudem. Boa parte do grid da Montana não tem condições de guiar um carro com 350 cv. Se você quer correr, tem a grana, não sente num carro desses com menos de 3 anos de experiência, pense melhor. Alguns nunca terão na vida a capacidade de andar num carro desses, mesmo tendo o patrocínio e o budget necessário, mas a consciência disso é difícil ter. Ganhe uns anos correndo em carros mais fracos pra depois subir pra categoria de carros potentes, por favor. Afinal, se depender da CBA, você tira carta hoje (em poucas horas) e amanhã já larga com 30 carros com mais de 300 cv cada. Pelos menos 25% da categoria Montana, não tem ainda experiência pra tocar um carro daqueles, isso é um fato.

E entendam que NINGUÉM é culpado pelo acidente. A porradaria come solta o tempo inteiro, foi um toque normal.

O relato de Cássio, piloto inteligente e consciente, é impecável. Já tem algum tempo que ele vem reclamando abertamente do que vem acontecendo neste automobilismo de cultura financeira. Cássio pode ter tal atitude por não estar por ora no meio. Os pilotos que estão sob o guarda-chuva da Vicar são proibidos de abrir a boca, em regulamento — não é novidade para ninguém que há uma lei da mordaça. Sofrerão retaliações se opinarem negativamente contra a categoria e a bandalheira que acontece. Todos os pilotos e dirigentes com quem eu e Evelyn Guimarães conversamos ao longo do fim de semana em Interlagos e em outros autódromos metem a boca na organização, mas sempre temerosos para que não tenham seus nomes divulgados. Esta gente que comanda — é impossível, repito, dissociar a CBA da Stock Car — se vinga com punições em pista e outras tantas fora dela.

A isso, agrego uma informação: os pilotos são também impedidos de reclamar e pontuar problemas nas reuniões que fazem nas corridas. Um piloto da Montana comentou comigo há pouco: “Eu estava pra falar para termos cuidado com o ‘push’ (-to-pass) em Interlagos, mas cadê o espaço?”.

Vai um relato pessoal: na última sexta, por volta de 18h, estava nos pits de Interlagos e logo vi os pilotos da categoria reunidos na sala de briefing. Perto da porta, estavam Pedro Boesel, Galid Osman e Douglas Soares, os três que, por coincidência, participam do bolão que organizo, o BRV. Falamos a respeito, tiramos sarro, e logo se aproximaram Thiago Riberi e Sondermann. Ainda falamos sobre previsões para a corrida, até que chegaram os comissários da mesma, e três deles — Sondermann, não — disseram para que eu assistisse ao encontro. “Aí você tem ideia de como é”. Declinei do convite. Não declinarei mais, quando puder. E hoje sei, por outros tantos, que “não se pode falar de assuntos que não estejam pertinentes à folha, ou seja, abre box em tal horário, safety-car, etc. Só”.

E quando a CBA, como declarou Felipe Maluhy, julga que não é necessário fazer algo na Curva do Café porque acha “chato”, a gente conclui que esta entidade está morta e ainda não enterrada porque não deram entrada na papelada para fechar a conta bancária na qual mamam — a CBAmerindus. Aliás, já são 22 horas depois do acidente e seu presidente mal se manifestou. Evidente que virá (se vier) com a verborragia da lamentação e de um provável luto oficial, mas o que ele vai fazer de prático realmente para que casos como os vistos ontem acabem? Conseguirá Cleyton Pinteiro fazer alguma coisa relevante e ativa depois de dois anos de mandato?, é o que pergunto em caráter oficial.

A morte de Rafael Sperafico não serviu de exemplo para as otoridades responsáveis. A de Sondermann, obrigatoriamente, tem de ter uma valia suprema. A começar para tirar esta casca de medo e repressão de todos os 55 pilotos que participam dos campeonatos da Stock Car e da Copa Montana. “Cadê a união e a coragem?”, é o que me perguntou um deles. Pois que alguém tenha uma iniciativa, marque uma reunião e todos juntos as busquem e cobrem, principalmente, da CBA o tanto quanto as carteirinhas que a entidade tunga deles.

Está mais do que claro que os pilotos são feitos de marionetes ricas, que pagam o pato e preços bem altos para sustentar a farra. A partir de agora, que passem a se valorizar porque são eles que promovem aquele espetáculo, pseudo ou não, e que honrem suas bolas, machos que são a quase 250 km/h, e que, se acharem o caso, não corram enquanto tudo não estiver de acordo. Para que eles mesmos, como Cássio, não tenham medo de voltar à pista. Para que domingos em Interlagos ou em qualquer autódromo, enfim, nunca mais se transformem em outro replay de ontem.

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