Blog do Victor Martins
F1

Molho inglês, 5

SÃO PAULO | Webber ficou puto, mas tão puto, putíssimo, que desde o fim do treino classificatório, sem engolir muito a história da asa que era sua e foi passada para o ‘primeiro piloto’ Vettel, ficou se remoendo, vingativamente pensando na largada do dia seguinte, num piso sujo, numa reta não muito grande e estreita. […]

F1-PRIX-GREAT-BRITAIN-SILVERSTONE-WEBBER" src="/wp-content/uploads/2010/07/temp_Webber_macaco_ING-591x1024.jpg" alt="" width="378" height="655" />SÃO PAULO | Webber ficou puto, mas tão puto, putíssimo, que desde o fim do treino classificatório, sem engolir muito a história da asa que era sua e foi passada para o ‘primeiro piloto’ Vettel, ficou se remoendo, vingativamente pensando na largada do dia seguinte, num piso sujo, numa reta não muito grande e estreita. Webber jantou, dormiu, acordou, escovou os dentes, viu-se no espelho e deparou com dois olhos cheios de sangue. “É hoje”, me disseram que disse sem der dito, e partiu para Silverstone.

O Webber visceral e gutural nunca foi posto à prova. Nunca precisou mostrar muita coisa a quem quisesse. Embora o mundo saiba que seu tratamento seria, mais ou menos dia, de segundo piloto diante de um companheiro sabidamente mais talentoso, Webber sempre teve de ser o único a não aceitar e evitar tal situação. Mas Webber sempre reagiu sempre num tom mais camarada e nobre, vide sua reação no acidente com Vettel na Turquia. Só que uma simples asa mais evoluída que lhe foi tirada aponta a notória mágoa e o sentimento de que foi subjugado e passado pra trás.

Todos nós sabemos que, movidos pela ‘vendetta’, acabamos nos superando. Webber se superou hoje. Olhando agora, era óbvio que seria ele o vencedor na Inglaterra. Webber passou um dia se preparando. Vettel não largou tão mal, havemos de rever mil vezes e analisar. Foi Webber quem largou super bem.  Webber conseguiu chegar no fim daquela pequena reta já à frente do parceiro. E ninguém no mundo o faria perder aquela primeira posição por um segundo que fosse.

A vingança de Webber funcionou como malogro para Vettel, que três curvas depois escapava e caía para último com um furo no pneu. Má influência. Vettel, se fosse esperto, teria usado uma figa vermelha sob aquele macacão de touro. Hamilton, que passou um zicado Alonso e que naturalmente seria quarto nesta corrida face o desempenho nos treinos, recebia o segundo lugar de presente. Sabedor de um carro limitado, fez a corrida certa para manter-se à frente no campeonato. Mas Hamilton foi mero coadjuvante diante de seu público.

Porque os olhos de Vettel também se fizeram vermelhos. Vettel não podia simplesmente aceitar e ver os dedos duvidosos apontados para si como o piloto protegido sem argumentos suficientes. Numa prova comum, é bem verdade que pouco faria. Seb andava em 15º, 16º, e não se aproximaria sequer da zona de pontos vendo o andor em toada de procissão. Mas fez-se o safety-car por De la Rosa, outro zica do pântano.

A corrida, então, mudou. Lá atrás. Vettel, então próximo dos outros, foi passando um a um. O decadente Liuzzi, o frágil Massa, o valente Alguersuari, o oscilante Petrov, o mediano Hülkenberg, o Schumacher que hoje estava alerta, e o excelente Sutil, à força. Um sétimo lugar que, no fim, traz alguns pontos que o mantém ali na briga. Mas que o põem atrás de Webber, que foi sarcástico. “Nada mal para um segundo piloto.”

A frase, dita na comemoração segundos depois após a bandeirada, via rádio para o mundo ouvir, foi o ‘teaser’ para o que estaria por vir. O satisfeito e vingado Webber ainda mostrava os resquícios da mágoa, prometeu uma conversa séria com a cúpula da Red Bull já nesta segunda e foi enfático: não teria assinado renovação nenhuma se soubesse que seria relegado daquela forma. E convenhamos: Webber tem toda razão. Se a Red Bull apregoa disputa, não tinha de mexer no vespeiro de Webber para dar o mel a Vettel. E agora cutucado, é Webber quem solta as abelhas e expõe um princípio de cisão que ele mesmo achava que aconteceria entre Hamilton e Button na McLaren.

Rosberg foi outro beneficiado com as ausências de Vettel e Alonso ali na frente. Ficou com um pódio. Sem se destacar, manteve-se à frente de Button que, mais uma vez, foi discreto e eficiente. Partindo em 14º, já era oitavo nas primeiras voltas e, após a parada nos pits, acabou subindo para sexto, para quinto, para quarto. O abandono de Kubica também lhe foi benéfico. O pneu furado de Massa, idem.

Massa, Massa. Primeiro que Felipe anda reunindo toda a zica que Alonso, De la Rosa e o eterno zicado Trulli têm. Peitou Alonso, chocou-se de leve com o companheiro, ficou à frente e logo na metade da primeira volta via seu pneu traseiro direito dechapado. Caiu lá para trás, e como anda acontecendo, lá permanece, sem passar ninguém. Aí, em 15º, na curva Lutfield,  escapou, evitou uma rodada, foi parar na entrada dos pits. A RGT tratou como “circunstância especial”, um lindíssimo eufemismo que encontraram para semelhante erro — aliás, a emissora voltou a tratar a Virgin como VRT, em novíssimo sinal de continuação de suas eternas babaquices pseudojornalísticas padronizadas. Massa, que chegou a ser líder do Mundial pela constância nas primeiras provas, agora está constantemente atrás de Alonso e tem tido constantemente apresentações ruins. Ainda que aponte a má sorte, Massa não tem feito nada para se recuperar nas corridas. Não dá, há de dizer alguém. Dá. Com o carro que tem, tem de dar. Para Vettel deu. Para Hamilton, sempre dá. Para Alonso às vezes dá. Então dá.

Alonso, Alonso. Tinha mais carro que Kubica, mas não passava nunca, até porque o talento de Kubica rende cavalos a mais no limitado carro da Renault. Sem espaço ali na região da curva Club, acabou na ‘grama’, a área de escape. Por ela, superou o polonês, e até já esperava que poderiam lhe mandar devolver a posição. Os comissários, lentos, pensando na vida, não se pronunciaram. Aí Kubica abandonou. Aí os comissários acordaram. Aí, como não havia como promover a troca de posições, tacaram o drive-through em Fernando. A punição até pode ser considerada exagerada, mas era o que tinha de ser feito por um benefício indevido que Alonso teve. É que, zicado, deu azar por Kubica ter problema no diferencial. Aí, putinho, ele soltou: “Não quero mais falar no rádio durante a corrida”. Piti mundial no meio da corrida. Que coisinha, ui, ui…

Diferencial tem sido Barrichello na Williams. Um quinto lugar que ilustra, novamente, seu bom momento e sua expertise — como adora dizer Flavio Gomes quando quer rebuscar seus medianos textos — aplicada no carro azul e branco. Kobayashi, então, brilhante com este obscuro carro da Sauber. Belíssimo sexto lugar. Sutil acabou oitavo, antecedendo os compatriotas teutônicos Schumacher e Hülkenberg.

Agora, a questão é ver como a Red Bull e Webber vão se portar daqui pra frente. Curioso que a F1, na metade do campeonato, tem um protagonista que a vida toda fez papel de coadjuvante. Mas que, se ler isso, vai querer mostrar, com ‘sangue nos zóio’, que é o maior piloto da história.