Blog do Victor Martins
F-Indy

Um lugar a Indicar, o evento em SP

SÃO PAULO | Sobe som. De análise. A corrida da Indy em São Paulo é o exemplo mais próximo e recente de como as pessoas, de um modo geral, esperam acontecer algo de ruim para tomar uma providência, sem perceber ou ter em mente que tomar medidas que combatessem os problemas desde o início seriam mais […]

SÃO PAULO | Sobe som. De análise.

A corrida da Indy em São Paulo é o exemplo mais próximo e recente de como as pessoas, de um modo geral, esperam acontecer algo de ruim para tomar uma providência, sem perceber ou ter em mente que tomar medidas que combatessem os problemas desde o início seriam mais do que suficientes. Isso vai desde a questão da reta do sambódromo, afeita inicialmente a um mundial de patinação ou ao curling, estivesse São Paulo num inverno suprarigoroso, até o furto do laptop do excelente fotógrafo Miguel Costa Jr..

Na quinta-feira em que aconteceu o sumiço do notebook do Miguel, o Anhembi estava exposto a quem quisesse, não só aos jornalistas. Não era necessário credenciamento. Os seguranças estavam longe da sala de imprensa. O resultado, com a presença de delegados, não era de se surpreender. “Ah, isso só acontece no Brasil”, teve quem falasse. Não, não acontece só no Brasil. Acontece em qualquer lugar porque tem gente com espírito de porco em todo lugar. Em Jerez, Marcelo Ferronato teve seu protetor de ouvido levado. “Ah, mas é um protetor de ouvido. Foda-se. Não é o valor do aparato. É o fato. Mas aqui no Brasil, as coisas tendem a seguir o velho laissez-faire francês, o deixar fazer, para então arregaçar as mangas e evitar posteriores contratempos. Na sexta-feira, já eram dois ou três os seguranças na porta do espaço da mídia. Então não houve mais quem se queixasse de que desapareceu alguma coisa simplesmente do nada.

Quando Tony Kanaan chegou levemente emputecido a tal sala de imprensa no sábado após o primeiro treino livre, a saraivada de críticas veio em cima de Tony Cotman, o mentor e projetista da pista, isentando o restante da organização, a saber a TV Bandeirantes e a prefeitura de São Paulo. Se foram levados todos no bico, Bandeirantes, prefeitura e a IRL em si também devem ser responsabilizadas. Porque não houve um ser destes três níveis que chegou a contestar Cotman se era imprescindível jogar um piche naquele piso do sambódromo — raspar as linhas demarcatórias do carnaval foi um paliativo de quem tratou a pista em si em segundo plano. Precisou que os carros sambassem naqueles tantos metros de passarela, sem quase acelerar a metade do que são capazes, e outros encontrando o muro em quarta ou quinta marcha, tipo Ryan Briscoe, Bia Figueiredo ou Milka Duno — se bem que ela encontra o muro em qualquer superfície— para que providências rápidas fossem tomadas. À noite, lixaram todo o sambódromo e, voilà, puseram Davey Hamilton, o piloto, digamos, reserva da Indy para então avaliar com o carro de dois lugares se a solução era eficaz.

Então veio o domingo, e houve corrida. E a grande maioria com quem conversei saiu com uma boa impressão, porque, além de nestes casos ser a última impressão aquela que fica, não havia como esperar algo pior do que havia se passado no dia anterior. E foi uma baita corrida, também por várias coisas: por o GP do Bahrein na F1 de horas antes ter sido lastimável, porque a pista de rua, seja qual for, proporciona momentos mais emocionantes e porque veio a chuva. E foi ótimo ela ter vindo de forma torrencial. Porque mostrou, num evento esportivo para tantos e múltiplos países, os problemas que São Paulo vive. Uma chuva forte de 20 minutos alagou o trecho da Marginal e parte da reta do sambódromo. E a prefeitura e também o governo, não só da dupla Kassab-Serra, mas os anteriores também, agem sempre depois que a catástrofe se instala. Como Kassab e Serra não podiam construir piscinões ontem, restou aos fiscais a tarefa de escoar para onde pudessem aquele aguaceiro com seus rodos rápidos.

Uma frase, a de Kanaan, é simbólica: “Só aqui querem fazer uma corrida em quatro meses”. Uma segunda, que ouvi na transmissão da TV, também: “É o maior evento esportivo do ano”. Agora a Bandeirantes e a prefeitura vão ter um ano para pegar tudo que (não) foi feito para este ano, sentar, planejar, conversar e ouvir, e fazer certinho para 2011, para que seja um evento impecável, para que os americanos não fiquem na transmissão zombando e caracterizando o modus operandi do brasileiro como o terceiro mundo que não existe mais na geopolítica. E que a TV e a prefeitura possam, então, falar com propriedade que se trata de um ótimo evento esportivo — não o maior, afinal, ao que me conste, em 2010 há uma Copa do Mundo, e a F1 tem mais valor —, sem que se vomite descaradamente inverdades e se mascare todos estes problemas em rede nacional a pessoas minimamente inteligentes.

Ótimo que se tenha a Indy em São Paulo e ótimo que permaneça. A Indy é uma ótima categoria, e o público gostou. Como eu gosto, tanto quanto a F1, e torço por ela. Mas que as pessoas que dela cuidam não enganem e não se enganem novamente.